sábado, 25 de abril de 2009

Controle Social

Debatendo algumas alternativas para o controle social relativo a temas como direito penal do inimigo, política criminal, drogas.

Particularmente o fracasso da política norte-americana de "guerra às drogas" e a emergência da política de redução de danos está estreitamente relacionado com a política internacional e sua noção de segurança nacional.

A demanda por controle social representa em geral como uma preocupação de políticos e estadistas, no entanto nos últimos anos usuários de drogas, ONgs de AIDS/drogas, profissionais da saúde, movimentos sociais comunitários clamam por controle. A problemática do controle não se coloca apenas para as políticas sociais, mas principalmente para os consumidores de drogas. Em geral, o senso comum percebe o uso de drogas através da idéia da perda dos controles, sem visualizar a possibilidade do auto-controle, do não-abuso. Ela é a mercadoria mas controlada pelo Estado , através de uma qualificação jurídica, caracterizada por três pontos: 1- um efeito sobre o sistema nervoso central; 2- capacidade de criar dependência física ou psíquica; 3- noção de perigo sanitário e social .

Os rituais de consumo de drogas e as regras presentes nas redes de usuários ajudam a controlar e a regular essa prática, da seguinte forma: 1- Maximizando o efeito de droga desejado; 2- Controlando as dosagens de uso de drogas; 3- Balanceando os efeitos positivos e negativos do uso de drogas; 4- Prevenindo problemas secundários Quais são os limites entre o uso e o abuso no consumo de drogas? Quais são as variáveis que diferenciam o uso controlado do uso descontrolado? O consumo de drogas não se restringe a uma expressão de psicopatologia ou doença, e nem tampouco apenas desvio e marginalidade, mas pode expressar também rituais e valores da norma, como no caso do álcool.

O que diferencia um consumidor de drogas lícitas das ilícitas? Por que drogas como o álcool e a nicotina, comprovadas cientificamente danosas, são liberadas e a maconha considerada leve, "inócua", é proibida? Quais são os fundamentos do regime proibicionista às drogas? A distinção entre o legal e o ilegal não seria fruto apenas de uma arbitrariedade cultural fundada no controle útil dos delinquentes? Comer, o beber e a atividade sexual são necessidades básicas, cuja satisfação está controlada pelos costumes, religiões e leis. Vale lembrar as leis dietéticas judias fundadas no velho testamento, que proíbem a ingestão de inúmeros alimentos. As drogas participam também desse regime dietético e seu consumo pode ser controlado em razão de preceitos semelhantes, por intermédio dos chamados controles tradicionais e “ïnformais” presentes na cultura do consumo de drogas

O consumo de drogas tornou-se uma contrapartida patológica apenas recentemente, com os Estados modernos conferindo aos médicos o poder de prescrever medicamentos e privar as pessoas da liberdade de ingerir certas substâncias psicoativas. Até 1914, nos EUA, as pessoas tinham o direito a autodeterminação e automedicação quanto ao uso de drogas, medicamentos psicoativos ou não, como expressão dos direitos fundamentais da pessoa humana.

Qual a razão dessa transformação política e moral? O que representa essa ingerência do Estado na vida privada dos cidadãos, através do controle público de drogas? A organização de uma delinquência isolada e fechada não seria possível sem o desenvolvimento dos controles policiais, da fiscalização geral da população e da vigilância. A ilegalidade e o sistema carcerário especificam o tipo de delinquência, como efeito direto de uma penalidade para gerir as práticas ilegais, que investe num mecanismo de "punição-reprodução", do qual o encarceramento será uma das peças principais.

Numa passagem do livro Vigiar e Punir sobre o tráfico de drogas e armas: "A delinquência, ilegalidade dominada, é um agente para a ilegalidade dos grupos dominantes. Atualmente, o problema das drogas supera a questão simplesmente médica, pois o proibicionismo criou novas questões e problemas a ele relacionados, tais como o crime organizado, a violência, a corrupção, a instabilidade política, a lavagem de dinheiro.

Esse "negócio" está entre as três atividades mais lucrativas do mundo, formando uma rede direta e indireta que emprega milhares de pessoas na produção, distribuição e consumo.Narcotráfico não é apenas um comportamento delitivo, mas um verdadeiro processo produtivo de mercadorias, mesmo ilegal. Essa atividade se diferencia dos outros crimes organizados (roubo a banco, sequestros etc) por agregar valor, o que explicaria a reduzida eficácia da lei penal frente ao narcotráfico . As drogas são mercadorias, cuja proibição vem possibilitanto lucros extraordinários e consolidando uma poderosa economia ilegal. Segundo estimativas da ONU, toda atividade ligada às drogas movimenta na economia mundial 500 bilhões de dólares por ano.

Essa economia proporciona uma acumulação de riquezas e poder sem precedentes, o que vem representando em muitos países, como os andinos, uma instabilidade institucional permanente.Junto ao narcotráfico temos outras atividades correlatas como o roubos, assassinatos, sequestros, lavagem de dinheiro, corrupção etc. Esse último é fator de preocupação para as democracias, pois tem a capacidade de corromper autoridades públicas, policiais e juízes. O proibicionismo e a política de guerra se mostraram um fracasso como política de controle de drogas. Cada vez mais, torna-se um imperativo a elaboração de alternativas e políticas democráticas para lidar com os controles e as regulamentações relativas às drogas. Políticas que respeitem os usuários de drogas em seus direitos, para que possam ser incluídos e tratados como cidadãos.

A abolição do direito penal não é de forma alguma uma opção agradável aos seres humanos e muito menos para os seus direitos humanos. É que a existência da pena é de grande relevância para o controle social da vida quotidiana: os seres humanos necessitam do direito penal, do direito processual penal e das penas para a sua própria proteção.
A observância do direito penal a prisma do controle social implica no fato de que as sanções penais resultam da necessidade de se manter a ordem, a paz e o equilíbrio quotidianos ou, melhor, da sociedade. o delito se constitui como "a infração da lei do Estado, promulgada para proteger a segurança dos cidadãos, resultante de um ato do homem, positivo ou negativo, moralmente imputável e politicamente danoso". Sob essa perspectiva, o delito é um comportamento contrário à ordem social, tendente a prejudicá-la, de modo que se faz necessária uma repressão: a sanção penal.

A sanção penal, ao lado das sanções cíveis (ou não-criminais), é uma das formas de controle social, o qual, teoricamente, é o mesmo para todos, ou, como deixa entrever: todo ser humano está sujeito à existência da pena, a qual se constitui em uma reação estatal à violação de bens e interesses tutelados pelas normas penais. É que o Estado, como representante da sociedade, detém o direito de punir (ius puniendi), de modo que o deve utilizar corretamente, vale dizer: a infração que supostamente tenha violado bem ou interesse tutelado pela ordem legal penal deverá receber a devida apuração, com respeito a todos os procedimentos processuais penais e a todas as garantias da pessoa humana.

Entende-se, assim, que a sanção penal é uma forma de controle social e que deve ser limitada e regulamentada, haja vista constituir forma "de invasão do Poder Estatal na liberdade" do ser humano [04], de modo que há que se respeitar o rol de garantias e de direitos estabelecidos pelo Estado democrático de direito. A aplicação da sanção penal mediante o correto procedimento e com respeito às garantias que todo indivíduo possui é interesse de toda a sociedade, tanto daqueles que sofrem os delitos quanto daqueles que os praticam: "naturalmente, os delinqüentes também estão interessados em que o ordenamento jurídico continue a ter vigência [05]", isto é, uma pessoa que se apropria indevidamente do dinheiro de outra não há de querer que terceiro se aproprie do dinheiro seu ou de familiar seu; do mesmo modo que um sujeito inocente acusado de ter matado outrem quer que seja devidamente processado e julgado, para, muito provavelmente, caso não haja algum acidente de percurso, como queima de arquivo ou erro do judiciário, ser absolvido. .

É por isso que não se pode pretender abolir o direito penal, haja vista este promover, ao lado de outras normas sociais (não-jurídicas), o controle social, de modo a manter a sociedade em equilíbrio e ordem: "o direito penal não é somente uma realização das necessidades punitivas da sociedade, ele é ao mesmo tempo também seu rompimento; ele é controle social e, ao mesmo tempo sua formalização .

O fim da pena não é que se faça justiça, nem que seja vingado o ofendido, nem que seja ressarcido o dano por ele sofrido; ou que se amedrontem os cidadãos, expie o delinqüente o seu crime, ou obtenha a sua correção. .O fim primário da pena é o restabelecimento da ordem externa da sociedade. O fim primeiro da sanção penal é restabelecer, após uma condenação ou uma absolvição, a ordem, a sensação de segurança da coletividade como um todo, e, reflexamente, caso seja possível, a sensação da parte que foi vítima do delito ou que foi vítima de acusação infundada de ter sido feita justiça. E aí está a necessidade de um direito penal enquanto controle social voltado para o devido processo legal, com fulcro nos direitos humanos fundamentais, para se aplicar, ou não, uma sanção.

Segundo Jakobs, o direito penal moderno poderia ser dividido em dois ramos: o direito penal do cidadão, para pessoas, e o direito penal do inimigo, para não-pessoas. Deve-se, a princípio, levar em conta que a doutrina mais recente considera não haver distinção entre cidadãos e pessoas, direitos do cidadão e direitos humanos fundamentais, de modo que cidadãos são pessoas e vice-versa, e direitos do cidadão e direitos humanos fundamentais são a mesma coisa. Assim, voltar-se-ia o direito penal do cidadão para as pessoas, sujeitos de direitos, e o direito penal do inimigo para as não-pessoas, objetos de direito.

A crítica posta em relação ao direito penal do inimigo, encontra esteio na necessidade de, no controle social decorrente do direito penal material e processual, haver respeito pelo menos a um núcleo essencial de direitos humanos fundamentais; tal núcleo, como se pode extrair das palavras é "um conjunto formado por uma seleção desses direitos, tendo em vista principalmente sua essencialidade, dentre outros critérios".: a todas as pessoas, sem quaisquer distinções, são assegurados direitos e garantias fundamentais, ou seja, independente do crime cometido e da reincidência, ocorra esta antes ou após o cumprimento da pena imposta ao indivíduo, o indivíduo mantém um mínimo essencial de seus direitos, a fim de que tenha respeitada sua dignidade humana.

Nesse prisma, é de se lembrar de as caçadas comandadas pelo governo norte-americano pelas cabeças de Osama bin Laden e de Saddam Hussein. Após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, os Estados Unidos da América iniciaram sua política externa de guerras contra um suposto "eixo do mal", ou, a melhor dizer, inimigos dos Estados Unidos, de modo a burlar recomendações das Nações Unidas e a forjar documentos, como restou comprovado no caso da (in)existência de armas de destruição em massa no Iraque. A política de ataques ao Afeganistão, por tentar encontrar Osama bin Laden, o mentor intelectual dos ataques de 11 de setembro de 2001, e ao Iraque, por tentar encontrar Saddam Hussein, o "dono" de poços de petróleo cobiçados pelo governo norte-americano, tem seus efeitos a serem sentidos até a atualidade: os civis de ambos os países foram os mais prejudicados, bem como os soldados americanos, os quais continuam a morrer por causa da ambição expansionista bushiana de "querer fazer chegar a democracia a tais países", ou, nas palavras de um conhecido personagem de desenho animado: tentar dominar o mundo.

O exemplo acima não é único de como têm sido julgados, processados e condenados os inimigos do direito penal, mas é exemplo mundialmente conhecido. Tal como realizar cruzadas para eliminar infiéis, ou, ainda, eliminar a judeus e homossexuais em campos de concentração, e, até, quem sabe, dizer que homens negros não têm alma, e por isso podem ser utilizados como escravos.

Todos esses exemplos giram em torno de um eixo comum, qual seja o de se considerar determinados indivíduos como objetos, e não sujeitos de direito, o que, como dito mais acima, é a tônica da abordagem do direito penal do inimigo. De se dizer, uma verdadeira dissolução do direito penal material e processual e suas respectivas garantias, um enorme desrespeito aos direitos fundamentais dos seres humanos e uma tremenda violação à dignidade da pessoa humana, SENDO UM TOTAL DESCONTROLE SOCIAL.

É raro a imprensa revelar os abusos do sistema prisional porque em geral a idéia é que deve amargar os sofrimentos do cárcere porque buscou a própia sina. Todavia duas matérias chamaram a atenção no noticiário, onde talvez não tenha servido para despertar atenção para questões de políticas de segurança pública e sobretudo quanto a situação de indignidade da população carcerária.

A primeira revelou a situação de presos mantidos num contêiner, numa delegacia de polícia do Espírito Santo onde a prisão consiste num cubo prisional de chapa metálica, sem janelas ou grades e com um pequeno buraco para entrega de quentinhas.É revoltante e desumano atividade essa que é praticada em pleno século xxi. O “enlatamento” de pessoas um acinte á dignidade humana e ofensa a toda ordem principiológica dos direitos humanos .
Se não bastasse, o mais perturbador dessa história é a naturalidade com que as autoridades responsáveis tentam justificar um modelo industrial de embalar presos como se tivesse encontrado uma solução para o déficit e alto custo para as edificações do sistema carcerário prisional. Sendo eles presos provisórios pouco importa a ofensa, a dignidade humana dos detentos supostamente autores de ações criminosas feri o princípio indúbio pró-réu conhecido como princípio da presunção de inocência.

A autoridade responsável pela custódia tem ousadia de afirmar que o local é bem oxigenado e que os presos á noite pedem para desligar a ventilação em razão do frio.
Na segunda reportagem, narra-se a série de cinco mortes de detentos em estabelecimentos prisionais, todos por enforcamento. Muito embora, a autoridade competente tenha dito em entrevista que foram casos de suicídio, sendo que o exame de corpo de delito sempre atesta a morte por enforcamento devido às características apresentadas. Somente com muito esforço de ingenuidade poderia se acreditar que em menos de um mês 5 mortes de presos, tenham sido resultado de suicídio e não de enforcamento.

Uma situação dessa gravidade tem que ser investigada ainda mais, quando há relatos de outras agressões como hematomas e marcas nos corpos das vítimas. A responsabilidade é do poder público mesmo se quisesse partir da história do carcerário local não sendo excluída tal responsabilidade .

Vivemos em um mundo onde tudo passa de linguagem e do poder de convencimento que alcança quando lançadas publicamente. Sendo que, se não existe o questionamento quanto ao que se foi expresso, os agentes estatais continuarão a usarem de tais atos ilícitos como se fossem legítimos. Seria interessante se não tivéssemos de assistir reportagens dessa natureza porém, pior que ter que ouvi-las é não saber de suas ocorrências, pois foram ocultadas oficialmente ou omitidas, silenciadas diante destas narrativas e fatos e que de modo nenhum pode ser declarada no Estado Democrático de Direito.

Texto enviado pelo aluno Anthony e TIAGO CARVALHO, integrantes do Grupo Terra(Controle Social).

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